O que matou João Porquinho


Era recalcado, desanimado e calado,
Muito fechado, vivia amuado,
Pra fazer pequenas tarefas estava empacado,
Por mais que o pai pedisse estava embezerrado

Nunca tinha estudado, nem era alfabetizado,
Era mesmo difícil até ele dar um recado,
Pra toda vizinhança, João porquinho era retardado,
Pra comer só chegava ao fogão, após todos terem almoçado.

Nunca tinha viajado, nem tão pouco passeado,
Passava o dia todo com o rádio ligado,
Não perdia um só minuto do programa policial,
Mas levava grande susto quando falava da morte de um marginal

Mas para os parentes que observava parecia coisa normal
Mas como um moço inculto e caseiro estar neste mundo infernal?
Neste mundo de sofrimentos muita surpresa pais tem recebido,
Às vezes o filho que confiamos, é o que mudará o sentido da nossa vida

Outra coisa que João gostava era de a TV ligar,
Três programas ele não perdia, domingo a tarde ver a bola rolar,
E durante a semana, as más notícias do jornal o faziam ele vibrar
E as novelas diárias faziam-no delirar

Toda noite depois da novela saia meio desconfiado,
De procurar pra onde iam seus pais já estavam cansados,
Desaparecia no escuro para lugar ignorado.
O pobre pai o procurava, voltando decepcionado,

A mãe nem se fala, cada dia mais acabada,
O que ninguém sabia que um triste fim estava reservado,
O sofrimento começou quando na mãe era gerado,
Após nove meses de sofrimentos, quase foi abortado.

Teve até mesmo que fazer um parto antecipado,
O que todos admiraram foi João e mãe ter escapados,
O menino após nascer não foi registrado,
Durante seu crescimento foi mal alimentado

Mas a família gostava dele, jamais foi desprezado,
Até seu aniversário por eles era comemorado
O pai era pobre, mas bem humorado,
Sua mãe com um  coração grande sentia nele o destino traçado

Porém ficava calada, pois o menino não dava lugar,
Quem pensaria que um dia, no mundo da droga ele iria entrar?
E nem que os pertences da mãe, ele viria a furtar,
Não sabe se com sinceridade, de manhã João ia orar,

Sem ninguém mandar cedo para a igreja punha a caminhar,
Será que João era sincero, ou a todos queria enganar?
Mas em sua curta trajetória mal de João ninguém viu falar,
Porém quase semanalmente sua mãe tinha que sonhar,

Várias vezes este menino foi na escola matriculado,
Mas não obteve qualquer resultado,
Certa vez a mãe percebeu que seu rádio foi furtado,
Mas estranho naquela noite, nesta casa não tinha entrado.

Com o choque do furto, para o hospital a mãe foi levada,
Saiu dizendo, esse rádio pra João foi presenteado,
Esse era um amor que João havia conquistado,
Doravante os furtos na casa foram continuados

Teve a vez da televisão, do canivete e do facão,
Dos talheres, das panelas e também do caldeirão.
E o último furto foi o do botijão
O que ninguém percebia que atrás de tudo estava o João

O nome João Porquinho foi lhe dado pela meninada
Que não via João tomar banho após jogar com eles uma pelada,
Seus pais compravam-lhe roupas, mas ele não as usava,
Preferia vestir calças velhas que a mãe remendava

Constantemente Dona Felicidade tinha um sonho interessante,
Numa mata próxima de casa uma árvore parecia falante.
No sonho a mata transformava num bosque importante
No lugar daquela árvore tinha uma praça muito brilhante

Ela via naquela praça pessoas importantes
Várias professoras, com muitos estudantes,
O prefeito falava muito e quase que se empolga
Mas ela gravou uma frase do prefeito, que dizia "não às drogas"

O que ninguém sabia onde a noite ele andava,
Certa madrugada na mata próxima, o cavalo o pai procurava,
O pai deu um desmaio quando a voz do filho ele escutava,
De mansinho o pai passou, pois a turma o ameaçava,

Uma voz ele escutou, está descoberto nosso complô,
Alguém disse em voz alta, queima o arquivo que o chefe mandou,
Senhor Justino homem justo, que todos admiravam,
O nome de dona Felicidade com o destino não coadunava

Menos João, os sete filhos todos estudaram,
Um tinha bom emprego, uma indústria comandava,
Outro foi bom contador, que das escritas cuidava,
Até mesmo odontologia a filha casada cursava

O que o pai não desconfiava que droga João tragasse,
Não percebiam que em seu quarto o haxixe João guardasse,
Não viam que a tosse do João era fruto da marijuana,
Com sua simplicidade na escola do crime estava graduando

Só depois da morte de João os furtos foram desvendados,
Uma noite João saiu, por todo dia foi procurado,
Seu pai não queria acreditar, mas foi desconfiado,
Debaixo daquela árvore, de balas seu corpo esta cravado,

O arquivo foi queimado nem vestígio tinha ficado
A população não podia acreditar que ali tinha tanto malvado,
Certamente pela ignorância, João no crime tinha matriculado,
Seu irmão que defendia criminoso deixou de ser advogado,

Seus irmãos muito sinceros com dignidade o enterraram,
Em honra aos pais guerreiros um projeto foi encaminhado,
Que uma lei fosse votada e o João Porquinho homenageado,
E no lugar daquela árvore um monumento fosse levantado

Que ali transformasse num bosque, como a mãe havia sonhado,
Que no centro tivesse uma praça, que João Porquinho fosse chamada,
Ali seria local para que palestras fossem dadas,
Mostrando a toda a criança, que a droga teria que ser extirpada,

Esta poesia é muito triste, mas tem sido a realidade,
Muitas vezes o mal mora conosco e nós nem por curiosidade,
Deixemos de acompanhar nossos filhos, colocando neles só santidade,
Amanhã pode ser tarde, quando soubermos da fatalidade.
 
Peço desculpas aqueles pais, que os passos dos filhos têm acompanhado,
Mas você que confia muito, ainda que com o coração machucado,
É melhor nós chorarmos um pouco, por negarmos algum favor,
Do que um dia nosso filho, da escola do crime sair um doutor.

Valeriano Luiz da Silva
Anápolis - GO - 03/04/2004


 

 
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