Lá, onde a terra enfrenta o mar…

 

 

Naquelas altas penedias que parecem querer desafiar a imensidão oceânica,

sopram ventos ferozes que sobem, em remoínhos, pelo alta falésia rochosa.

A espuma eleva-se no ar e a humidade salgada paira sobre o formidável
cenário

que nem as gaivotas ousam sobrevoar.

 

Este é o Cabo da Roca,

no extremo de uma das vertentes da Serra de Sintra

que configura a ponta mais ocidental da Europa.

 

"É lá que a terra acaba e o mar começa",

como o descreveu Camões na obra imortal Os Lusíadas.

 

Foi ao largo deste imponente promontório

que escrevi:

 

 

Talvez…

O Último Poema

 

Foi no mar que tudo começou.

A mão que pedia para escrever,

os olhos, cheios de brumas,

que me ditavam os versos e os vertiam na alma,

os cheiros da maresia

e de peixe acabado de pescar,

e o embalo da mansa perturbação da água

pela brisa do norte, chegada em murmúrios.

 

 

Foi neste mar de Portugal,

ao largo das alcantiladas penedias da Roca,

onde a terra penetra fundo no Atlântico

que me senti, pela primeira vez, Poeta.

Não porque as letras que ía desenhando

convergissem numa rima obrigatória,

mas porque a lógica deu lugar ao sonho,

porque senti emergir a doçura,

da contumaz razão analítica,

porque não lia na minha escrita

nada que não fosse amor, beleza, perdão.

A cadência da ondulação larga

como que… por magia

alisava em mim as arestas mais vivas

das memórias

deixando-as suaves, (quase) castas, redentoras.


Hoje voltei ao mar.

Andei… largas horas à deriva,

tal como me habituei a deixar que a pena

lavrasse os pensamentos, sem rumo definido.

Falei-vos… no presente (?) Estranho !

- porque hoje havia decidido

falar-vos de poesia…no passado.

Não sei se o consegui, ou se foi mais uma

das utopias desta mão já cansada,

deste espírito que se vai desapossando da metáfora,

provávelmente pela crua realidade das desilusões colhidas.

 

 

Havia decidido escrever, queridos leitores,

sem complicados artifícios, sem códigos,

um último poema.

E para quê rimar, se vocês entenderam?

- Se não puder ter ambos,

entre a poesia e o mar… talvez fique com o mar

e a vossa recordação,

que guardarei neste velho coração nostálgico.

 

Eugénio de Sá,

Maio de 2006

 

 

TEU ÚLTIMO PRIMEIRO POEMA

Luiz Poeta

Luiz Gilberto de Barros - Às 10 h e 20min do dia 27 de fevereiro de 2010do Rio de Janeiro - Brasil

especialmente para a eternidade da poesia do meu irmão português

Eugénio de Sá

 

Não te atrevas a deixar o último texto;

o pretexto do poeta é sempre vago

- como a vida - e se o destino é um mago,

a magia de viver faz o contexto.

 

 

Teus sentidos não te iludem... se é do mar

que despertas o melhor do teu sorriso,

é preciso navegar o impreciso

com os sonhos que tiveres que sonhar.

 

 

Zarpa... segue, sobrevive...iça velas

tuas telas carecem de tuas tintas

e se o verso é o pincel com que tu pintas,

teu amor repinta as tuas caravelas.

 

 

Mãos cansadas não inibem sentimentos...

há, no vento inefável que suspira,

polens soltos...  e se a alma os inspira,

absorve o melhor dos pensamentos.

 

 

Se a lágrima dilui todas as mágoas,

é no curso de uma lágrima arredia

que o amor transforma a dor em poesia

e o mar dissolve a dor nas suas águas.

 

 

Quando os olhos de quem chora ao te ler,

brilham mais que a solidão fria do mar,

é no brilho sedutor de cada olhar

que o teu sonho e teu amor hão de viver.

 

 

E se o mar de Portugal é o caminho,

Cada texto que tiveres que deixar,

há de ser tão infinito quanto o mar;

velejar é completar teu pergaminho.

 

 

Se um poema há de ser o derradeiro

desses tantos que tornaram-se infinitos,

teus poemas ´hão de ser sempre benditos

e o teu último poema, o primeiro.

...



 

 
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