Em Busca da Felicidade - 2ª Parte


Continuação

(
2ª Parte)

       Diante do inusitado comportamento de Marcela, ele viu-se tentado a aprofundar-se num diálogo com aquela bondosa moça, mas a atribulação de sua azáfama em servir todos os hóspedes obrigou-o a transferir seu intento para uma hora mais apropriada.

       __ Marcela, eu vou aceitar seu oferecimento, mas gostaria de conversar com você a respeito. A que horas você sai?

       __ Não antes das 14:30h.

       __ Posso esperar você para falarmos?

       __ Pois não... será um prazer!

       E lá se foi ela atender um impaciente e atabalhoado que a chamava aboletado à mesa quatro, querendo trocar o garfo que deixara cair no chão.

       Dr. Wellington, digo, Olavo para dar tempo ao tempo, reco-lheu-se ao quarto e, após escovar os dentes, deitado na cama mesmo vestido e calçado, barriga para cima, mãos entrelaçadas na nuca, olhar fixo no ventilador enguiçado com suas pás estáticas no teto, fez um ligeiro retrospecto de sua vida. Casou-se cedo com a moça que namorava desde os tempos de faculdade e que acompa-nhou sua bem sucedida trajetória no mundo encarniçado e compe-titivo dos negócios. Yolanda faleceu durante o parto de um menino que seria o sucessor de seu empório. Fora advertida pelos médicos sobre o grande risco de morte que correria ao levar sua gravidez adiante, mas negou-se peremptoriamente a abortar o esperado Au-gusto. Grande mulher, grande ser humano, grande companheira que sempre permaneceu ao seu lado e que morreu apertando sua mão com a força indescritível de um definitivo adeus. Seus pais morreram em um desastre aéreo e ele, inda nos seus trinta e qua-tro anos, filho único, não sazonado, recebeu como herdeiro legíti-mo, a incumbência de assumir a presidência das empresas de seu pai. Pós-graduado em administração de empresas, resistiu às ofer-tas de compra das fábricas e prosperou. Coração endurecido pelas adversidades que o destino lhe impôs, não muito, ou quase nada se importava com o próximo.

       Olhos umectados, levantou-se para beber um pouco d’água, mas a camareira não tinha enchido o filtro, assim como não prima-va ela por fazer uma boa faxina no quarto e jogava de forma displi-cente sua pouca roupa lavada e passada sobre a cama. Tudo conse-quência da omissão da convencional gorjeta; pobre Gertrudes, o oposto de Marcela.

       Ao pensar na Marcela, consultou as horas em seu Rolex que esquecera de deixar em casa e por isso não o usava no pulso, le-vando-o no bolso traseiro da calça. Os ponteiros indicavam a proxi-midade das 14:30h. Deu uma rápida penteada nos cabelos e foi para a calçada oposta à porta da pousada.

       Não muito depois surgiu a moça que despertara sua admiração e respeito. Atravessou a rua e interceptou seus passos.

       __ Esqueceu de mim, Marcela?

       __ Absolutamente. É que não lhe vi ao sair.

       __ Eu aguardava-a do outro lado da rua, na calçada oposta.

       __ De quanto o senhor vai precisar? Podemos dar uma passada no Banco que fica no caminho de minha casa.

       __ R$ 260,00 seriam suficientes (inventei a quantia de impro-viso) e fica combinado que pagarei a você no final desta semana. Sou vendedor de aparelhos eletrodomésticos e tenho comissões a receber sobre minhas vendas efetuadas. Mas, por favor, não me envelheça com esse tratamento cerimonioso de senhor.

       __ Combinado! Vamos então... A propósito, mês que vem so-prarei minha 36ª velinha.

       __ Ih... quase uma década nos separa etariamente (rimos).

       Nunca, jamais, em tempo algum, o silêncio sepulcral que in-terrompeu aquele diálogo foi tão longo e constrangedor para Ola-vo. No caminhar emudeceu tentando achar palavras para dizer. Cada passo dado soava-lhe como o tic-tac de uma bomba-relógio prestes a explodir.

       __ A tarde está linda, principalmente quando à sombra, livre deste sol escaldante (ela nada respondeu e ele achou-se um imbe-cil que deveria ter permanecido em seu mutismo).

       Finalmente, “séculos e quilômetros” após, chegaram ao Banco e o dinheiro sacado foi entregue sob absoluta confiança, com ne-nhum comprovante formal. Isso tocou Olavo no imo de sua alma, como uma lição de imenso valor aprendida.

       __ Obrigado, Marcela, fique tranquila que não pretendo fugir (rimos). Não querendo causar a impressão de ser inconveniente, apreciaria muitíssimo conhecer a senhora sua mãezinha. Você po-deria atender este meu pedido?

       __ Claro que sim! Poderemos prosseguir a pé, Cidade pequena tem essas vantagens, Tudo é perto, Mais algumas quadras e chega-remos à minha mansão. Espero que não repare!

       Aquela palavra “mansão” despertou de súbito o Dr. Wellington para a realidade, enchendo-o de uma culpa inocente por estar en-ganando Marcela e temendo a reação que provocaria nela quando soubesse a verdade sobre ele. Enfim, tarde se fazia para que retro-cedesse e, agora, só lhe restava seguir em frente.

FIM DA SEGUNDA PARTE

Ary Franco
(O Poeta Descalço)

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