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Hoje me revi ao fazer a barba...
Hábito diário que nunca reflete o
mesmo olhar, o mesmo rosto. Cada
dia um novo eu renasce, ou morre...

Hoje eles estavam estranhamente
tristes, distantes... Mãos, como
se não fossem minhas, no ritual
repetitivo dos anos, espalhavam
branca espuma suavemente.

O aparelho, com delicadeza, abria
caminhos por onde a pele ressurgia.
Mas, os olhos! Por quê continuavam
distantes ? E este silêncio que envolve
esta manhã tão mal acordada...

Despida da branca espuma, a face se
apresenta. Real, definida. Surgem as
marcas dos anos que foram na pele
se aprofundando. Seguem as rugas,
distraídas, a redesenhar o meu rosto...

Tento refugiar-me no passado. Busco
imagens que reflitam o prazer antigo
do olhar irresponsável, do encontro
inesperado, do amor inconsequente.
Apenas imagens vazias retornam...

Como na vida, acaricio as pequenas
feridas que a pele, fragilizada, ao corte
não resistiu.Como nos joelhos da infância.
Como nas brigas de amor...

Apago a luz. No desfalecer do brilho
meu olhar continua distante... Tento
quebrar a eternidade do momento
com um leve sorriso conciliador.

A vida me responde com indiferença...

Domingos Alicata
Rio de Janeiro - RJ - 14/12/2005



 

 

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