Minha mãe e as orquídeas


     Até onde a minha memória alcança, posso ver minha mãe sempre cuidando das suas plantinhas.

     Lembro-me bem de um jardim, em uma casa onde moramos em Deodoro  (hoje, Guadalupe), no subúrbio do  Rio de Janeiro. Eu de-via ter três ou quatro anos, mas, lembro-me bem das roseiras, das dálias enormes e dos girassóis que me fascinavam! Mas, sobretudo, lembro-me de minha mãe conversando carinhosamente com suas orquídeas! Eram belíssimas! As flores amarelas, vermelhas, lilases e brancas, tinham um jeito nobre entre as flores daquele jardim!

     Que as rosas me perdoem, mas, as orquídeas da minha mãe rei-navam absolutas!

     Sempre que eu via minha mãe "conversando" com  suas orquíde-as, eu me aproximava, na minha curiosidade infantil. Minha mãe sempre me dizia:

     - Filha: as plantas são vivas! Elas entendem as nossas palavras e gostam de receber carinhos.

     Quando cuidamos direitinho de uma plantinha, ela nos agradece ofertando-nos lindas flores, assim como essas orquídeas estão fa-zendo agora.

     Acho que foi através da minha mãe que eu me apaixonei por essas flores altivas e belas.

     Por razões que desconheço, mudamos para um apartamento no bairro de Coelho Neto. Ficou para trás o maravilhoso jardim da minha mãe. Hoje eu posso imaginar o quanto custou para ela aban-donar as suas plantinhas. Mas, minha mãe era uma guerreira! Nunca baixou a cabeça aos obstáculos que a vida nos impõe. E na pequena varanda de um apartamento no quarto andar de um edifí-cio, minha mãe deu início ao seu novo jardim. Em menor escala, claro, mas, em vasinhos de barro, em latas de leite em pó e em xaxins, surgiam exuberantes suas rosas, flores de maio, antúrios e as suas maravilhosas orquídeas.

     As orquídeas só florescem uma vez por ano, por isso, são tão ansiosamente aguardadas.

     Minha mãe estava com noventa anos, e esperava ansiosamente a florada de uma nova orquídea, quando um tombo a levou de nós. Foi difícil aceitar que aquela mulher forte, lúcida e saudável tives-se morrido. Eu e minhas quatro irmãs: Auretes, Neyde, Nelly e Ma-ria da Graça, na semana que se seguiu ao sepultamento, sonhamos com a minha mãe entre orquídeas! Foram sonhos diferentes, em dias diferentes, mas, sempre, de algum modo, mamãe estava entre as orquídeas. E no dia da missa de sétimo dia, ao voltarmos para a casa da mamãe, Nelly, emocionada, nos levou até a varanda pa-ra ver as plantas da nossa mãe. E tivemos a grata surpresa de ver a muda que minha mãe aguardara tão ansiosamente, com lindas orquídeas da cor lilás. Eram lindas e nos fez chorar de alegria!

     Sabíamos que mamãe, através das orquídeas, estava nos dizen-do:

     - Não fiquem tristes. Eu estou muito bem!

Nilda Dias Tavares
Rio de Janeiro - RJ


 

 
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