O preconceito


Obs. Texto narrado por meu pai, Pedro Sabino da Mota (1912/-)

Este Conto recebeu as seguintes Premiações:
01 – Concurso de Contos - Casa do escritor – Junho/2006 - 7.º Lugar  (Menção Honrosa).
02 – Concurso "Machado de Assis" – 2.º Lugar – Categoria Contos - Redacional Editora – Londrina – PR – 2006
03 – 18.ª Antologia de "Contos de Autores Contemporâneos" - Editora CBJE - RJ - Julho/2006

Jiquiriça, município da Bahia, no tempo do cangaço e do coronelis-mo.

Meu pai, quando tinha 12 anos, estava parado, montado numa mu-la, conversando com um fazendeiro.

Aproximou-se um vaqueiro cavalgando uma mulona e perguntou de maneira prepotente e arrogante, expressando claramente o seu preconceito:

– Negro, o Coronel Coimbra está aí?

Não respondeu.

Meu pai, silenciosamente, apontou com o dedo, revelando que aquele que ele procurava estava ao seu lado.

Imediatamente o recém-chegado compreendeu sua insensatez, ti-rou o chapéu justificando-se:

– Coronel, perdoa-me!

Eu pensava que o senhor pelo poder e riqueza, fosse branco!

– O que você quer?

O vaqueiro lhe mostrou um envelope, no qual um documento infor-mava a entrega de dois mil bois.

– Desça nesta estrada e na terceira cancela, há um rapaz para re-ceber o gado.

Ao terminar, venha almoçar comigo!

Chegando ao local indicado, acenou para meu pai, deu-lhe uma gratificação em dinheiro, dizendo:

__ Estou com medo que aquele negro me mate!

__ Não se preocupe: ele é uma pessoa boa!

Desculpe-me, o senhor é um homem de idade e eu sou criança, mas, os ricos tanto podem ser gente branca como preta!

O vaqueiro subiu a escada que o levaria ao sobrado, encontrando o Coronel vestido de terno, gravata e chapéu brancos.

– Reconhece agora que eu sou o Coronel Coimbra?

Vou lhe mostrar minha autoridade!

O vaqueiro ajoelhou-se desesperado e pediu perdão.

Havia um sino na parede da varanda onde estavam.

O Coronel puxou a corda várias vezes, ecoando um som ensurdece-dor.

Surgiu então, uma multidão de "jagunços" negros (o mesmo que ca-pangas, pistoleiros ou cabras).

Impossível determinar a quantidade, pois sumiam de vista; todos usavam os cabelos e a barba longos e estavam armados com rifles de repetição.

O Coronel fez um gesto com a mão para que fosse realizada uma  demonstração das armas e eles fizeram pontaria para o vaqueiro.

Este fechou os olhos, pressentindo o seu fim.

Contudo, em seguida, todos se dispersaram.

O Coronel explicou que o almoço estava pronto e que depois trata-riam de negócios.

Era o ano de 1924, trinta e seis anos após a abolição da escravatura no Brasil (hoje em 2007, cento e dezenove anos), épocas distintas, porém, comportamento idêntico na atualidade.

Para que adotar atitudes de desprezo com relação aos outros?

O ser humano ainda não aprendeu a respeitar o seu semelhante, não  entendeu o significado das palavras de Jesus: "Amarás o teu próximo como a ti mesmo." (Mateus 22:39).

Atualmente, tal atitude é considerada crime contra a honra. Racis-mo.

No código penal, a pena é de reclusão de um a três anos e multa.

Rosimeire Leal da Motta
Vila Velha - ES


 

 
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